segunda-feira, 29 de novembro de 2010

My Idea of Fun

*Notas preliminares:

1- Estamos de volta depois de um mês de “férias”, inteiramente dedicado à minha monografia de conclusão de curso. Correria!

2- Esse texto é dedicado à Isabelle Penha Ribeiro, amiga querida, cujo trabalho e dedicação tenho a honra de acompanhar de perto. Agradecimento especial a ela pelo convite para publicar o texto A Reinvenção de Orfeu na revista de cultura que a tem como uma das editoras, a Pop-Up. Não percam!

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Ele é magrelo, parece uma lombriga, é bem velho e faz você ter inveja da sua energia quando pula, canta e domina o palco. Por mais de uma hora e meia. E além de tudo ele é meio estranho. Iggy Pop é bem diferente dos Beatles, dos Rolling Stones, e também não é nada parecido com os ídolos Jimmy Hendrix e Janis Joplin. Enquanto eles aparecem em grupos de semelhantes, a figura de Iggy se destaca brutalmente dos demais Stooges. Sim, o cara é diferente, e a música dele é diferente também. Afinal, não se declara o amor, via de regra, cantando now I wanna be your dog; para conseguir achar isso maravilhoso (e acreditem meninos e meninas, é maravilhoso) é preciso se deixar levar por aquilo que Iggy pensa, fazer um pacto com ele ao longo das músicas. Ou seja: dar um peteleco na preguiça.

Tudo bem, mas você não tem que criar coragem de abrir uma música. Seu amigo põe no carro, ou calha de estar tocando no café da esquina. Eventualmente, uma homenagem à sua tenista predileta no Youtube a traz como trilha sonora... E depois, sempre temos o maravilhoso “O que você está ouvindo” no MSN, perfeito pros dias de tédio musical. Mas raramente alguém lê pra você um trecho de livro; nunca você vai cruzar com um à toa. Sim, podem falar algo, mas daí até chegarmos às letrinhas miúdas... Principalmente quando o livro nos dá a maldita preguiça. E no geral, isso está relacionado ao tamanho do dito cujo.

Sim, livros de oitocentas ou novecentas páginas... QUÊ? Sim, livros de duas mil páginas em oito volumes. Como, mas como raios se animar pra ler um livro que talvez leve o mês inteiro ou até um ano pra chegar ao fim? Olhamos a Montanha Mágica, de Thomas Mann, e num primeiro momento ela é muito mais montanha. Sim, é preciso persistir; livros como esse, no geral, dão muito pouco de si aos leitores no começo, vão se revelando aos poucos. Sim, enquanto seu amigo comentou dos últimos cinco escritores que leu, você diz com orgulho “cheguei até a metade!”. Escalar essas páginas requer uma vontade especial de ver o mundo do topo.

É só de lá, no entanto, que podemos ver um certo tipo de mágica. É que por serem tão cheiso de detalhes, se ocuparem tanto tempo de alguns personagens e nos manterem curiosos pelo mundo que nos oferecem, esses catataus de trocentas-e-lá-vai-pedrada páginas revelam algumas coisas que os livros pequenos não têm. O camarada até fica chato, fala sempre do mesmo assunto, conta a ação do livro como se fosse fofoca quentinha; perde a noção de que não são todos os que estão vivendo naquele lugar. Chega, inclusive, a marcar na agenda o horário da palestra do Dr. Krokowski, ou então passar raiva por não receber um convite para o sarau da Duquesa de Guermantes. Que nem quando começa a namorar; só que é mais difícil dizer que não se vai com a cara de uma namorada de oitocentas páginas.

O pacto é difícil, mas vale a pena. É preciso, vez ou outra, deixar de sair um diazinho; talvez, pensar em não ler a revista semanal, em sacrificar uma hora do dia durante um bom tempo. O livro está lá pra ser enfrentado, e não adianta querer calcular quão mais próximo se está do fim. Aos poucos, o tesão aumenta; você entende uma coisa, entende outra, as engrenagens se encaixam. Você é surpreendido, e a surpresa te deixa puto da vida. Você se programou pra ler trinta páginas no dia, e lê cinqüenta, sessenta. Um dia engata; lê cem. E era um sábado! Finalmente, você entende pra que raios servem os domingos, do mesmo modo como entendeu por que três acordes eram suficientes, ou o que tinha a ver o saxofone com o rock. Você cria uma nova idéia sobre diversão, e urra pedindo pro livro levá-lo para passear. Com a coleira e a guia entre os dentes.